Não se explica as coincidências das paixões
Ck
A primeira paixão futebolística é como a primeira namorada platônica, seja a menina da carteira do lado ou a intocável professora do alto da plataforma. Mas são as paixões que nunca se esquece. Na escolha do time, ou até dos times de futebol, é quase igual. A paixão logo ali do lado ou a distante. Às vezes, dependendo da época as duas. Essas nunca deixarão de ser as primeiras paixões e as que sempre povoam nossos sonhos até, para os mais insistentes, a morte.
Comigo a tal menina do lado do futebol foi o Paysandú, de Brusque, para
os menos conhecedores do futebol, o verde e branco, e a professora o Flamengo, o rubro negro. Torcer para o Paysandú era
ir a campo, gritar, ver ao vivo a magia dos passes, dos toques, dos gols gritados abraçando o alambrado como o melhor amigo. Já torcer pelo Flamengo era o platônico de apenas ver de longe pelo mágico tubo da televisão, em branco e preto, onde o preto era preto e o vermelho era cinza. Mas era o rubro negro sem alambrado. Era a paixão televisiva materializada nos
botões do futebol de mesa a cores.
Duas paixões que sempre acordam nos sonhos para fatos. E os fatos mostram que
os deuses do futebol gostam de brincar com
as paixões. De suas coisas em comum e incomum.
Pois Paysandú e Flamengo, apesar de suas distâncias no futebol, o de Brusque já
só na lembrança do menino do alambrado, o do Rio de Janeiro campeão do mundo, despertaram meu
menino num falto insólito. Acho que não
há essa coincidência no futebol brasileiro. Ambos foram campeões em
campo sem títulos de fato ou outorgados.
Começando pelo “mais querido”, o Paysandú de Brusque foi campeão catarinense em 1956, jogando contra os principais clubes profissionais do estado dos times mais tradicionais do futebol catarinense. Foi campeão de fato em campo mas... Naquele ano
a então organizadora do futebol do estado dividiu a disputa em dois torneios: o grupo especial (os times profissionais, entre eles o Paysandú) e o grupo da Liga (times amadores). Os dois campeãs dos grupos disputariam jogos finais para decidir o campeão de 1956. Paysandú venceu o grupo Professional, também chamado de Estadual. Foi o melhor dos times profissionais do estado.
Depois de três meses o torneio dos times amadores da Liga teve sua conclusão. A entidade do futebol estadual da época determinou que
haveria uma disputa para decidir o campeão do estado. O Paysandú já
não mais treinava e dispensou mais da metade do time, enquanto o Operário, de Joinville, um
time amador, continuava na disputa. Os dois jogaram as finais e o Operário venceu os dois jogos, sendo consagrado o único campeão de um torneio profissional com um time amador em Santa Catarina. Paysandú de Brusque foi o campeão estadual de Santa Catarina de 1956, mas
o título acabou para o Operário.
Mas o que tem isso com o Flamengo do RJ? Loucura de torcedor por certo. Talvez paixão, a paixão é louca. Em 1987 a CBF não
organizou o campeonato brasileiro. Um grupo de times, o Clube dos treze, resolveu organizar a disputa entre eles. A CBF voltou atrás e criou uma disputa nacional, como tantas outras dantes, com dois módulos: O verde (dos times do Clube dos treze mais convidados) e o amarelo (o que
seria a segunda divisão nacional). O Flamengo acabou campeão do Módulo Verde com o Internacional em segundo. Já no amarelo Sport Recife e Guarani foram decretado campeões depois de uma disputa de pênaltis que não acabou.
A CBF “virou a mesa” (a CBF sempre vira a mesa ao seus interesses e conveniências) e, como não houve campeão do Módulo Amarelo, decidiu que aconteceria um
quadrangular entre os quatro melhores dos dois grupos. Flamengo e Inter e Sporte Recife e Guarani. Os times do Clube dos treze se recusaram a aceitar
a “virada de mesa da CBF” e não
jogaram as finais da CBF. Com os dois
eliminados por WXO, Guarani e Sport Recife fizeram a final do campeonato brasileiro de 1987, com o Sport sendo
decretado campeão pela CBF.
Como o Paysandú de 1956, campeão em campo, o Flamengo teve que brigar
por esse título nacional, chegando até
ao STF.
Minhas duas grandes paixões de infância no futebol, mesmo separadas por
um grande diferencial de times, me brindaram com
uma coincidência única de títulos de campões conquistados de fato em campo e reconquistados por
direito. Talvez só importante para um torcedor apaixonado. Talvez...
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