Dizer que o homem brasileiro é viciado em futebol é de uma obviedade colegial. Mas digo mais: é um vício sem tratamento e estimulado desde que nasce. Pai que é pai compra o uniforme do seu time para o filho homem antes do primeiro ano de vida. Se duvidar, antes do primeiro mês. Começou o vício. Mais que argentinos, franceses, alemães, italianos e ingleses, os inventores das regras do futebol, mas esses inventam regras para tudo, o brasileiro assume o vício pelo “esporte bretão” e não quer nem ouvir falar em tratamento.
Talvez a explicação por essa “paixão” esteja na memória atávica. O futebol é como se fosse uma batalha, uma luta entre tribos que substituiu os embates ancestrais. Analisando o jogo, o futebol é sempre com muito contato físico, correria, marcação corporal e busca de espaço. Às vezes, extrapola o campo de batalha e se espalha para os assistentes, virando mesmo uma batalha entre torcedores.
Nessa situação, o atávico extrapola o lúdico e vira real, mas não é a regra. Futebol e dentro de campo. O objetivo principal do jogo, levar a bola para dentro do gol do adversário, é a verdadeira conquista de território, deixando o inimigo caído no campo de batalha, olhando a vitória momentânea do outro.
Pense nos times de futebol. São exércitos de onze homens, uniformizados, com um brasão no peito e defendendo uma bandeira e as cores escolhidas. Como uma nação, cada um tem seu hino que é entoado pelo torcedor apaixonado. Fora do campo, os torcedores com suas bandeiras e ”gritos de guerra” incentivam os “heróis da batalha” para a conquista. Não é apenas um jogo de 90 minutos, é uma conquista sobre o time rival, a derrota do inimigo imaginário.
Se o homem brasileiro é viciado por futebol, e isso já sabemos, com a transmissão do esporte pelas televisões a cabo esse vício saiu do consumo socialmente aceito das quartas-feiras e domingos, para uma “chapação” diária dentro de casa. Para o viciado, tem jogo todo dia. Tem droga sempre e ao alcance do controle remoto.
Na sagrada hora do jogo não há mais família, não há filhos, esposa ou qualquer outra coisa a não ser a liberação da memória ancestral das batalhas, da adrenalina, do lúdico, da luta imaginária. E por pior que seja a “pelada”, libera a química do cérebro que leva ao êxtase, transformando o homem comum num “futebolômano”.